Iniciativa visa promover conscientização e educação a agressores por intermédio de grupos reflexivos.
O combate à violência contra a mulher é uma das bandeiras prioritárias do Governo de Sergipe. Mas a gestão compreende que, como uma problemática complexa, ela precisa ser trabalhada em diversas frentes. Nesse sentido, um dos projetos desenvolvidos por meio da Central Integrada de Alternativas Penais (Ciap), vinculada à Secretaria de Estado da Justiça e de Defesa do Consumidor (Sejuc), é o ‘Homem com H’, que visa atender o homem autor de violência doméstica e familiar.
O foco da ação é promover a reabilitação e educação através de grupos reflexivos. O agressor é encaminhado a esses grupos na Ciap após a realização das audiências de custódia, quando há o flagrante de violência doméstica e familiar. Ele passa por uma equipe multidisciplinar, com psicólogo e assistente social. Os encontros são realizados em grupo, com um total de 12 sessões, e média de 15 participantes por encontro.
Desta forma, os grupos possibilitam discussões entre os próprios homens, fazendo-os refletir em diversas questões de gênero. “A raiz pode ter sido originada de uma violência doméstica, mas muitas vezes está enraizada nele a crença de gênero. O grupo tem a finalidade de fazer ele perceber, através da própria reflexão e responsabilização, os marcadores enraizados. Muitas vezes há origens no patriarcado, machismo estrutural, do ambiente onde essa pessoa foi criada”, disse o diretor do Ciap, Roberto Figueiredo.
Na maioria dos casos, os homens que chegam ao Ciap são provenientes de violência psicológica contra companheiras, e muitos dos que são encaminhados a este trabalho sequer sabem que tal ato se constitui como um tipo de violência. Por isso, as sessões possuem, também, um trabalho educativo e lúdico. É o que explica uma das psicólogas do projeto, Karen Belfort. “Eles chegam aqui, em sua maioria, bem revoltados, bravos, porque a naturalização da violência ainda existe. Ouvimos muitos relatos como ‘eu só xinguei e ameacei, foi um momento de raiva, uma explosão’, e na cabeça deles isso não é violência. Mas, ao longo do processo, eles vão acalmando, entendendo e identificando aquilo que os trouxeram até aqui, tornando-se pessoas melhores para conviver em sociedade”, pontuou.
Em um cenário de abertura e acolhimento, o ‘Homem com H’ faz com que eles consigam se abrir, entender e melhorar como seres humanos. É o caso de O. S., 28 anos. “Quando eu cheguei aqui, pensava que o grupo reflexivo era cada um explicar o seu relato. Mas, no decorrer das sessões, os profissionais foram mostrando que o grupo serve tanto para você aprender, quanto para refletir sobre atitudes praticadas, Não é só sobre violência, mas sobre família, respeito, diversidade, entendimento da lei”, contou.
O participante G. N., 42, também reforçou a importância do trabalho do Ciap em sua vida. “Eu imaginava que seria um ambiente pelo qual eu não precisaria passar. Mas, no decorrer dos encontros, vi que eu cometia algumas violências que a gente não tem consciência. A gente melhora, inclusive, como ser humano mesmo, pensando no outro lado, dando a devida importância àquela pessoa, vendo todo um contexto geral. Eu só tenho a agradecer por essa oportunidade”, relatou.
Abordagem reflexiva
A dinâmica dos grupos exige grande preparação dos envolvidos no trabalho, visto que são apenas 12 encontros para cada turma. De acordo com uma das assistentes sociais do ‘Homem com H’, Horrana Lyandra, a filtragem é feita pensando na reflexão de acordo com a Lei Maria da Penha, com temas como o surgimento da lei, tipos de violência, dúvidas sobre medidas impostas, masculinidades, machismo, feminismo, família, assuntos pessoais dentro de cada realidade, e relatos de outros casos para discussão.
“A gente pensa cada temática com muito carinho, e não podemos trazer todo tipo de assunto para dentro do grupo, pois são só 12 encontros. Temos a necessidade de filtrar essas temáticas para refletir de acordo com a Lei Maria da Penha. A ideia de trazer relatos de outros grupos e dos participantes que já passaram por aqui, é para quebrar um pouco a ideia de que eles estão aqui pagando pena, obrigados, e trazê-los para refletir”, explicou.
Parceria com o TJ
A ideia do ‘Homem com H’ não é isentar os agressores da responsabilidade, mas, sim, promover a reabilitação e educação por meio de grupos reflexivos, conscientizando estes homens para que eles não voltem a praticar o ato de violência. Neste sentido, é fundamental a parceria com o Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe (TJSE), que atua ao lado do Ciap e da Sejuc em todo o processo.
Segundo a psicóloga da Coordenadoria da Mulher do TJSE, Sabrina Duarte, a ideia vem sendo desenvolvida há mais de 10 anos. “Desde 2013, a gente vem conversando com a Secretaria da Justiça. Quando surge a Ciap, a Sejuc nos procura para construir a ideia dos grupos reflexivos. A capacitação dos profissionais da Ciap é de excelência, sendo seguros, capacitados, e envolvidos na causa com os grupos reflexivos”, ressaltou.
O desafio é imenso em trabalhar a ideia com a própria sociedade, mostrando o real propósito do serviço. “Alguns pensam que estamos passando a mão na cabeça de um agressor, mas não é isso. Temos o dever de fiscalizar as alternativas penais, acompanhar, e sobretudo garantir o acesso a direitos. Ele vai pagar pelo que cometeu, mas de uma forma que a gente consiga recuperar esse autor”, pontuou Roberto Figueiredo.
Também já existe um pleito do Tribunal de Justiça pela expansão do projeto. Atualmente, ele é realizado apenas no Ciap em Nossa Senhora do Socorro, mas tem sido discutida a ideia de ampliar a outros grandes municípios do estado, como Lagarto, Propriá e Itabaiana.
Humanização
De acordo com o Ciap, há um recorte bem definido dos homens que por ali passam: quase 78% são negros, 44% são jovens, e quase 70% deixou os estudos ainda na 4ª série. Por isso, o trabalho de humanização é necessário para levar conhecimento e quebrar este ciclo.
Durante a entrevista, caso os marcadores biossociais do indivíduo identifiquem que ele parou nos estudos, mas quer retomá-los, ele passa pelo setor pedagógico, e sai com o encaminhamento para uma escola próxima. Caso seja identificada alguma vulnerabilidade, também é acionada a rede com encaminhamento para inscrições no CadÚnico, Bolsa Família, e no Núcleo de Acompanhamento Familiar (NAF) do município de Socorro.
Karen Belfort destaca a importância deste esforço conjunto não apenas para os homens, mas também para quem está envolvido no trabalho. “É um trabalho de formiguinha, como ver a borboleta se transformar. No último encontro, a gente ouve todos eles e, nesse momento, vemos homens chorando porque perceberam o quanto foram modificados. Esse trabalho me desconstruiu como pessoa. Não estamos em posição de julgamento, e irei trabalhar com elas como seres humanos”, afirmou.
Horrana Lyandra compartilha do mesmo sentimento. “É, realmente, muito gratificante quando, ao final dos encontros, aquela pessoa que chegou aqui achando que não fez nada e que foi injustiçada, evolui. O papel da instituição é acolher, não somos julgadores.O trabalho não para só aqui conosco, mas continua com eles lá fora, e isso é muito bom”, concluiu.
Fonte: Governo de Sergipe
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| Foto: Igor Matias |
O combate à violência contra a mulher é uma das bandeiras prioritárias do Governo de Sergipe. Mas a gestão compreende que, como uma problemática complexa, ela precisa ser trabalhada em diversas frentes. Nesse sentido, um dos projetos desenvolvidos por meio da Central Integrada de Alternativas Penais (Ciap), vinculada à Secretaria de Estado da Justiça e de Defesa do Consumidor (Sejuc), é o ‘Homem com H’, que visa atender o homem autor de violência doméstica e familiar.
O foco da ação é promover a reabilitação e educação através de grupos reflexivos. O agressor é encaminhado a esses grupos na Ciap após a realização das audiências de custódia, quando há o flagrante de violência doméstica e familiar. Ele passa por uma equipe multidisciplinar, com psicólogo e assistente social. Os encontros são realizados em grupo, com um total de 12 sessões, e média de 15 participantes por encontro.
Desta forma, os grupos possibilitam discussões entre os próprios homens, fazendo-os refletir em diversas questões de gênero. “A raiz pode ter sido originada de uma violência doméstica, mas muitas vezes está enraizada nele a crença de gênero. O grupo tem a finalidade de fazer ele perceber, através da própria reflexão e responsabilização, os marcadores enraizados. Muitas vezes há origens no patriarcado, machismo estrutural, do ambiente onde essa pessoa foi criada”, disse o diretor do Ciap, Roberto Figueiredo.
Na maioria dos casos, os homens que chegam ao Ciap são provenientes de violência psicológica contra companheiras, e muitos dos que são encaminhados a este trabalho sequer sabem que tal ato se constitui como um tipo de violência. Por isso, as sessões possuem, também, um trabalho educativo e lúdico. É o que explica uma das psicólogas do projeto, Karen Belfort. “Eles chegam aqui, em sua maioria, bem revoltados, bravos, porque a naturalização da violência ainda existe. Ouvimos muitos relatos como ‘eu só xinguei e ameacei, foi um momento de raiva, uma explosão’, e na cabeça deles isso não é violência. Mas, ao longo do processo, eles vão acalmando, entendendo e identificando aquilo que os trouxeram até aqui, tornando-se pessoas melhores para conviver em sociedade”, pontuou.
Em um cenário de abertura e acolhimento, o ‘Homem com H’ faz com que eles consigam se abrir, entender e melhorar como seres humanos. É o caso de O. S., 28 anos. “Quando eu cheguei aqui, pensava que o grupo reflexivo era cada um explicar o seu relato. Mas, no decorrer das sessões, os profissionais foram mostrando que o grupo serve tanto para você aprender, quanto para refletir sobre atitudes praticadas, Não é só sobre violência, mas sobre família, respeito, diversidade, entendimento da lei”, contou.
O participante G. N., 42, também reforçou a importância do trabalho do Ciap em sua vida. “Eu imaginava que seria um ambiente pelo qual eu não precisaria passar. Mas, no decorrer dos encontros, vi que eu cometia algumas violências que a gente não tem consciência. A gente melhora, inclusive, como ser humano mesmo, pensando no outro lado, dando a devida importância àquela pessoa, vendo todo um contexto geral. Eu só tenho a agradecer por essa oportunidade”, relatou.
Abordagem reflexiva
A dinâmica dos grupos exige grande preparação dos envolvidos no trabalho, visto que são apenas 12 encontros para cada turma. De acordo com uma das assistentes sociais do ‘Homem com H’, Horrana Lyandra, a filtragem é feita pensando na reflexão de acordo com a Lei Maria da Penha, com temas como o surgimento da lei, tipos de violência, dúvidas sobre medidas impostas, masculinidades, machismo, feminismo, família, assuntos pessoais dentro de cada realidade, e relatos de outros casos para discussão.
“A gente pensa cada temática com muito carinho, e não podemos trazer todo tipo de assunto para dentro do grupo, pois são só 12 encontros. Temos a necessidade de filtrar essas temáticas para refletir de acordo com a Lei Maria da Penha. A ideia de trazer relatos de outros grupos e dos participantes que já passaram por aqui, é para quebrar um pouco a ideia de que eles estão aqui pagando pena, obrigados, e trazê-los para refletir”, explicou.
Parceria com o TJ
A ideia do ‘Homem com H’ não é isentar os agressores da responsabilidade, mas, sim, promover a reabilitação e educação por meio de grupos reflexivos, conscientizando estes homens para que eles não voltem a praticar o ato de violência. Neste sentido, é fundamental a parceria com o Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe (TJSE), que atua ao lado do Ciap e da Sejuc em todo o processo.
Segundo a psicóloga da Coordenadoria da Mulher do TJSE, Sabrina Duarte, a ideia vem sendo desenvolvida há mais de 10 anos. “Desde 2013, a gente vem conversando com a Secretaria da Justiça. Quando surge a Ciap, a Sejuc nos procura para construir a ideia dos grupos reflexivos. A capacitação dos profissionais da Ciap é de excelência, sendo seguros, capacitados, e envolvidos na causa com os grupos reflexivos”, ressaltou.
O desafio é imenso em trabalhar a ideia com a própria sociedade, mostrando o real propósito do serviço. “Alguns pensam que estamos passando a mão na cabeça de um agressor, mas não é isso. Temos o dever de fiscalizar as alternativas penais, acompanhar, e sobretudo garantir o acesso a direitos. Ele vai pagar pelo que cometeu, mas de uma forma que a gente consiga recuperar esse autor”, pontuou Roberto Figueiredo.
Também já existe um pleito do Tribunal de Justiça pela expansão do projeto. Atualmente, ele é realizado apenas no Ciap em Nossa Senhora do Socorro, mas tem sido discutida a ideia de ampliar a outros grandes municípios do estado, como Lagarto, Propriá e Itabaiana.
Humanização
De acordo com o Ciap, há um recorte bem definido dos homens que por ali passam: quase 78% são negros, 44% são jovens, e quase 70% deixou os estudos ainda na 4ª série. Por isso, o trabalho de humanização é necessário para levar conhecimento e quebrar este ciclo.
Durante a entrevista, caso os marcadores biossociais do indivíduo identifiquem que ele parou nos estudos, mas quer retomá-los, ele passa pelo setor pedagógico, e sai com o encaminhamento para uma escola próxima. Caso seja identificada alguma vulnerabilidade, também é acionada a rede com encaminhamento para inscrições no CadÚnico, Bolsa Família, e no Núcleo de Acompanhamento Familiar (NAF) do município de Socorro.
Karen Belfort destaca a importância deste esforço conjunto não apenas para os homens, mas também para quem está envolvido no trabalho. “É um trabalho de formiguinha, como ver a borboleta se transformar. No último encontro, a gente ouve todos eles e, nesse momento, vemos homens chorando porque perceberam o quanto foram modificados. Esse trabalho me desconstruiu como pessoa. Não estamos em posição de julgamento, e irei trabalhar com elas como seres humanos”, afirmou.
Horrana Lyandra compartilha do mesmo sentimento. “É, realmente, muito gratificante quando, ao final dos encontros, aquela pessoa que chegou aqui achando que não fez nada e que foi injustiçada, evolui. O papel da instituição é acolher, não somos julgadores.O trabalho não para só aqui conosco, mas continua com eles lá fora, e isso é muito bom”, concluiu.
Fonte: Governo de Sergipe
